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Dicas de Escrita

O papel social do escritor

A escrita sempre foi um instrumento para os autores expressarem suas ideias, causas e opiniões. O escritor opta por um ou mais gêneros literários, se entrega ao processo e publica dizendo ao mundo a que veio. Mesmo que ele crie somente obras de ficção, por exemplo, a escolha do tema já diz muito sobre ele, sobre o que ele acredita e sobre as questões que ele deseja levantar com a sua escrita.

Nesse contexto, é interessante observar que cada época traz suas vertentes, ou seja, tendências de assuntos que estão gritando na sociedade e por dentro de cada um. Seguindo ou não essas vertentes, o escritor vai abordando assuntos que fazem parte da sua vida — reflexões, questionamentos, experiências, aprendizados, dores, traumas, entre tantos outros — e que ele não quer ou não pode mais deixar guardados para si.

E onde está o papel social do escritor, afinal? Exatamente na coragem e na responsabilidade de trazer à tona esses temas. O autor pode até ter escrito pensando somente na sua própria realidade, mas, no momento em que a sua escrita encontra os leitores, podem surgir pontos em comum, afinidades, novas e diferentes interpretações, ou seja, uma vez que a mensagem foi transmitida, ela é, de qualquer forma, absorvida.

Para falar com mais propriedade sobre este assunto tão relevante nos dias atuais, entrevistamos o escritor Tônio Caetano, autor de "Terra nos Cabelos", vencedor do Prêmio Sesc de Literatura 2020 e autor de “Sobre o fundo azul da infância”. Confira a entrevista na íntegra.



Tônio, você acredita que todo escritor que publica textos ou livros tem um papel social diante do seu leitor?

Um texto não é só um arranjo de palavras, não é só uma história, não é só linguagem, não é só diversão, não é só o que se quis dizer, é também uma forma do escritor intervir no mundo. É preciso exercitar sim o lugar livre da criação, mas também é preciso pensar no lugar da recepção, no lugar da responsabilidade para com o leitor.

Entendo que todo escritor tem sim papel social. E este papel se realiza a partir do que se entrega ao leitor. Esta tem sido uma das maiores preocupações quando reflito sobre meus textos: o que Tônio Caetano está entregando?

Sou leitor desde que me entendo por gente, também nos últimos três anos realizei algumas leituras críticas e, mais atualmente, tenho realizado leitura crítico-sensível para uma grande editora. Neste caminho, apurando o olhar, tenho observado que há escritores que — conscientes ou não — entregam aos leitores racismo, machismo, capacitismo, homofobia, estereótipos e estigmas sociais de toda sorte. Há texto que preciso ler mais de uma vez para ter certeza de que estou lendo aquilo em pleno século XXI.

Isso reafirma a necessidade de pensar também sobre o nosso tempo. Qual é o espírito do nosso tempo? É utilizar a escrita para dar continuidade a tanta alienação e desserviço ao humano? É brigar para utilizar palavras que reforçam preconceito, palavras que ofendem? É contar as mesmas histórias de sempre, falar dos mesmos personagens de sempre, da mesma forma de sempre?

Talvez, de forma geral, o papel social do escritor seja produzir cultura com a sua verdade, contar novas histórias e não ser desserviço à história.


Qual é, na sua visão, o seu papel social enquanto escritor?

A minha escrita é um movimento a partir do espaço íntimo, da reflexão, da conversa entre a vida na ficção e a vida fora dela. E se, a partir deste movimento, eu conseguir estabelecer diálogo com os leitores, realizarei um pouco do meu papel como escritor. E é tão incrível quando isto acontece, quando um texto faz sentido para pessoas que você nem conhecia. Assim sigo contando novas histórias, fazendo a minha parte contra o atraso.


Como você vê o lugar de fala na literatura? Mesmo sendo um termo já muito discutido, quais aspectos você acredita que ainda precisamos falar sobre?

Entendo que todas as pessoas têm lugar de fala. Todos falamos de algum lugar. Não existe fala neutra, sem origem num repertório, vivências em termos de gênero, raça e classe social. Lugar de fala para mim não é interdito à expressão do ponto de vista de alguém sobre qualquer assunto. “Você não pode falar/escrever sobre isso ou aquilo” me parece reduzir, desviar a atenção sobre as questões que importam.

O conceito de lugar de fala é muito mais abrangente, assim espero que continuemos falando sobre a fala como disputa de poder, sobre quem domina os espaços privilegiados de fala na sociedade, sobre quem se acha universal e sobre a necessidade urgente do contraditório, de perspectivas diversas em todos os debates.


Tônio Caetano é escritor, especialista em Literatura Brasileira pela PUCRS e servidor público municipal. É filho de Virginia e Armindo, cresceu correndo com os seis irmãos pelas lombas da Vila Vargas, periferia de Porto Alegre. Autor do livro “Terra nos cabelos”, Editora Record, Prêmio SESC de Literatura 2020 na categoria Conto, e do livro “Sobre o fundo azul da infância”, Editora Venas Abiertas, Prêmio Academia Rio-Grandense de Letras 2021 na categoria Narrativa Curta. É uma pessoa em busca da própria voz, do seu lugar na luta que cabe a cada um diante da realidade, da página em branco e de si.

 

 

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