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Leitura sensível, o que é e qual a importância



Leitura sensível é o trabalho realizado por um leitor que faz parte de um grupo específico ou que conhece a realidade retratada no livro. Por exemplo, um autor escreve um livro que aborda a cultura muçulmana, mas ele não é e não conhece pessoas muçulmanas. O risco de ele se equivocar é grande sem um leitor sensível atento aos detalhes.

Este profissional avalia como o autor se refere a determinado grupo. O leitor sensível está atento a qualquer reprodução de discurso de ódio que não agregue à narrativa, estereótipos e preconceitos, linguagem ofensiva e todos os aspectos que podem gerar revolta e críticas sobre o tema abordado.

Vantagens da leitura sensível

1. Um texto submetido ao leitor sensível se torna mais verossímil, autêntico e, consequentemente, melhor escrito;

2. O público consegue se identificar mais com o assunto da obra e com o escritor;

3. O autor evita constrangimentos desnecessários e críticas específicas quanto ao tema;

4. O escritor demonstra preocupação e cuidado com aquele grupo citado na obra;

5. Maior segurança para o autor em abordar um tema da maneira correta.

Quando submeter uma obra ao leitor sensível

Quando o tema do livro não é vivenciado pelo autor e quando ele não faz parte de determinado grupo abordado. Alguns exemplos:

1. Personagens não-brancas, como pessoas negras, indígenas, orientais, etc. Nesse caso, o risco de usar estereótipos é grande;

2. Personagens com deficiência de qualquer tipo;

3. Personagens neuroatípicas como autista, por exemplo;

3. Questões psiquiátricas como ansiedade, depressão, transtorno bipolar e síndrome do pânico;

4. Questões de gênero e representatividade com expressões de gênero, orientação sexual, transgeneridade e outras;

5. Violência física, psicológica e sexual.

Buscando enriquecer este tema, entrevistamos Anderson Siqueira Pereira, escritor e psicólogo, autor dos livros O Zeitgeist e Sugar; Bruna Agra Tessuto, autora de Bastidores de Emma e integrante da equipe da Metamorfose; e Luísa Aranha, autora do Guia de Autopublicação pela Amazon, além de inúmeros livros, e finalista do prêmio Sesc de literatura categoria Romance (2017).

1. Como você classifica e qual a importância da leitura sensível principalmente para livros?

Anderson: Acredito que a leitura sensível seja bastante importante no momento em que estamos escrevendo livros com conteúdos que possam ser potencialmente ofensivos ou perturbadores. Obviamente é importante ter claro qual o nosso objetivo ao escrever um livro, afinal, em muitos momentos nosso objetivo é causar “mal estar” como uma forma de reflexão. Mas, em muitos casos, podemos causar mal estar de forma não intencional e acabar criando textos que possam disseminar ideias preconceituosas ou a invalidação da vivência de outras pessoas. Isso se torna mais importante quando estamos escrevendo sobre algo do qual não fazemos parte, como por exemplo uma questão racial, cultural ou gênero diferente dos nossos.

Por mais bem intencionado que sejamos, é difícil conseguir se colocar completamente na perspectiva de uma pessoa que vive o fenômeno que estamos tentando retratar na literatura. Justamente por isso, podemos acabar trazendo ideias estereotipadas ou ofensivas. Por isso, a leitura sensível é uma prática importante que deve ser adotada.

Bruna: Vejo a leitura sensível como um cuidado com a obra. É importante porque podemos sempre deixar pelo caminho palavras inadequadas, ideias ultrapassadas, etc, e esse leitor nos ajuda na limpeza e na reformulação disso.

Luísa: A leitura sensível é uma necessidade cada vez mais atual. Preocupar-se com o público e com a interpretação do mesmo não costumava ser uma questão central do escritor. Por muito tempo, quando se perguntava a um autor por que ele escrevia, a resposta era sempre voltada para o ego do indivíduo em questão.

Hoje, já se entende que escrever é muito mais do que "porque quero", "porque preciso". Bons livros são escritos com uma boa história, mas mais do que isso, com o entendimento do que queremos dizer. E nem sempre isso acontece apenas com a visão do autor. Entre o que escrevo e o que as pessoas entendem, pode haver um abismo enorme, principalmente quando as situações ou temas propostos atingem diretamente o vivido pelos leitores.

A leitura sensível te dá essa possibilidade, quando sua obra traz assuntos espinhosos, tabus, violências das mais diferentes formas. É através de uma leitura atenta ao que está sendo dito, realizada por alguém que passou ou tem pleno conhecimento dos impactos de tal situação na vida real, que pode aparar as arestas e evitar críticas negativas.

2. Na sua opinião, quem está apto para fazer este trabalho (quais as habilidades deste profissional)?

Anderson: Isso depende muito do tema que o livro aborda. Acredito que a pessoa que deve fazer esse tipo de leitura deve ser alguém que já tenha vivenciado o fenômeno que estamos retratando no livro ou alguém que estude o tema. Além disso, talvez seja importante buscar pessoas que pensem de um ponto de vista diverso do autor, para poder observar como uma opinião diferente pode perceber pontos sensíveis que estão escondidos.

Obviamente, para que esse processo dê certo, é importante que o leitor entenda que estamos buscando formas de melhorar o livro e não ofender alguém. Da mesma forma, o autor necessita estar aberto às críticas do “leitor sensível”, sem tentar se defender, mas sim ouvir de forma atenta e pensar como aproveitar estas falas para melhorar a obra.

Bruna: Acredito que uma pessoa que esteja envolvida com literatura e que tenha um olhar atento e apurado.

Luísa: Não necessariamente a leitura sensível deve ser feita por um profissional. Claro que se a gente encontrar um preparador de texto que tenha uma visão mais elaborada do tema, será um grande achado. Mas a leitura sensível pode ser feita por um primeiro leitor, um leitor beta, ou testador de texto. O mais importante, no meu ver, não é a formação dessa pessoa e sim a bagagem que ela carrega quanto ao tema que precisa de atenção.

Sempre que trabalho com textos assim, procuro alguém que realmente tenha passado pela situação delicada. Explico, antes de mais nada, do que se trata o livro e peço pra que me relate como se sente lendo uma história que traz gatilhos a ela. Porque a leitura sensível é isso: perceber o que pode incomodar e ajustar para trazer o menor gatilho possível aos leitores em geral.

Usando como exemplo “Apenas o nada” e “Olhos fechados”, dois livros que retratam violência de gênero, a leitura sensível ficou por conta das próprias mulheres que entrevistei para compor o personagem. Numa leitura sensível eu não busco correções gramaticais, fluidez de texto ou problemas ortográficos, eu busco o sentimento do leitor, e só quem já passou por algo parecido é capaz de me dizer como se sente.

No caso desses livros, ambos têm gatilhos poderosos, com a descrição de cenas de violência, não só físicas, mas emocionais também. Incomoda as mulheres que já passaram por isso? Sim! Incomoda, faz lembrar e pode desencadear crises de pânico, ansiedade e outras, típicas de estresse pós-traumático. Por isso é importante avisar antes de pedir a leitura e, mais do que isso, considerar tudo o que a leitura sensível te passar.

Também vale lembrar que mesmo passando por uma leitura sensível e tendo o aval para a publicação, é sempre importante avisar na sinopse, capa ou no lugar que achar mais conveniente o aviso de gatilho, contendo as questões que podem incomodar o leitor.

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